O recente assassinato do jovem universitário da Faculdade Cásper Líbero em frente à sua casa reiniciou o debate sobre a pertinência ou não da redução da maioridade penal. Em primeiro lugar, entendemos e nos solidarizamos com o sentimento de perda de seus amigos e familiares. Cobramos do Estado também uma política de segurança pública e de prevenção à violência mais efetiva e respeitadora de direitos humanos.
No entanto, acreditamos que o alarmismo e a comoção social confundem o debate e geram falsas soluções para o problema da criminalidade, tão grave em nosso país. É bom lembrarmos que legislar sob a comoção social não é novidade no sistema penal brasileiro: tomamos como exemplo a ampliação da lei de crimes hediondos, com a inclusão do tipo penal de homicídio qualificado nestes, após a trágica morte de Daniela Perez, filha da escritora Glória Perez.
Em relação à reinserção do debate da redução da maioridade penal, uma rápida análise nas estatísticas mostra o caráter excepcional, dentre os menores infratores, daqueles que cometem homicídios. Menos de 2% dos internos da Fundação Casa em São Paulo praticou esse tipo de conduta. Para ilustrar, uma pesquisa do Ministério da Justiça de 2009 nos mostra que 86% dos cerca de 18 mil jovens sob medida socio-educativa estavam reclusos. A maioria executou crimes contra o patrimônio – roubo ou furto – e está em sua primeira internação. Igualmente equivocado é acreditar que tais jovens, normalmente também vítimas de profundas violências e abandonos em suas historias, tiveram tais posturas apenas pela certeza de que sairiam impunes.
Além disso, devemos ver as contradições inerentes à nossa sociedade que passam pelo retrato da violência no país. Quase metade dos casos de homicídio no Brasil são de jovens entre 12 e 18 anos, em sua maioria negros advindos das regiões periféricas. O debate deveria também se dar em como entender e barrar o crescimento da violência que dizima os jovens do país. E não é o que se vê nos grandes veículos de mídia, que ignoram nossos sérios problemas sociais frente à enorme insuficiência de políticas públicas de educação e proteção à criança e ao adolescente no país.
Outro ponto importantíssimo a ser colocado é se, mesmo para esses jovens que delinquiram, o cárcere representaria uma alternativa de ressocialização e reinserção saudável na sociedade. O que se percebe é que o sistema prisional brasileiro é falido e que mais de 70% dos condenados em regime fechado voltam a reincidir. Colocar jovens nessas condições apenas faz com que sejam mais estigmatizados e tenham sua dignidade violada.
Com todos os problemas de falta de estrutura e recursos, dados do Ministério da Justiça mostram que, nas unidades de internação de adolescentes, a reincidência é de 30%. É relevante dizer também que vários estados ainda não fizeram a reordenação institucional que separa as políticas e as instituições destinadas a jovens em situação de rua, como abrigos, daquelas voltadas à internação de adolescentes infratores, como a Fundação Casa. Até a edição do ECA, em 1990, ambos conviviam no mesmo espaço. Essa situação vigorava em 40% das Unidades da Federação em 2010.
A transformação real na vida desses jovens perpassa por medidas efetivamente socioeducativas, como atendimento psicológico e formação educacional. O Estado deve acompanhá-los em seus lares e escolas, além de tentar inseri-los profissionalmente. Acreditar que o encarceramento por si só é a melhor resposta para essa parcela da população é uma posição simplista e irresponsável, que apenas marginaliza ainda mais essa população socialmente vulnerável e estimula a violência.
Por essas razões e por sua ineficiência sob qualquer ponto de vista é que o Coletivo Contraponto se coloca em oposição à redução da maioridade penal. Acreditamos que a temática da infância e da juventude é de grande relevância para ser discutida tanto na sociedade, quanto no Largo de São Francisco. ¡C!
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